23.3.10

O museu Mineiro, fechado há quase dois anos, abre suas portas antes da reinauguração especialmente para receber os trabalhadores que ergueram seus novos espaços: a Sala Multi Uso e o Café.


foto acima (Daniel Mansur)



fotos Marconi Marques


“Ao lado do percurso o estranhamento de quem jamais havia pisado em um museu foi tomado pela certeza de que a arte e a história estão muito mais próximas do que se imagina e que museu não é um lugar onde estão quardadas as velharias”.
(Flávia Ayer - ESTADO DE MINAS 12/03/2010).





Fazer pensar a cidade a quem dela participa construindo e transformando constantemente sua paisagem assim como refletir sobre a importância dos Museus são os eixos de nossa ação educativos “obreiros à obra”.

"Colher de pedreiro não é pá"



Inaudível, quase estático, balbuciava Osiel quando os jornalistas anunciavam o objeto dentro da caixinha de veludo como a pá simbólica usada na instalação da Pedra fundamental das Secretarias de Estado na Praça da Liberdade.
“Não é pá, é uma colher de pedreiro e de origem portuguesa, olha só esta ponta fininha, esta é usada só para acabamentos, para coisas bem delicadas”, esclarecia Osiel ciente do saber adquirido sobre seu trabalho com os seus companheiros mais experientes.




Afinal, um museu só é deposito de coisas velhas?


sala Multi Uso em obra

"O museu é depósito onde pretendemos guardar alguma coisa, geralmente que tenha a ver com a nossa vida (portanto, numa relação com o ser humano).
Guardamos os objetos com determinada finalidade, seja de testemunho, seja para futuras pesquisas, seja por deleite estético, seja para manter ou relembrar uma estrutura social.

carrinho de mão na obra

Mas se não tivermos consciência do motivo que nos fez retirar esse objeto do uso cotidiano, por que o preservamos, por que o guardamos em determinado lugar (nos museus são os objetos sem identificação de origem, procedência, função etc.), então qual a razão de continuar mantendo-os?
Os museus, ao contrário das pessoas,
quase nunca se desfazem de seus
acervos, porque buscam ajuda em seus
pares e similares. Se eu não sei, alguém talvez saiba".

(Marco Antônio Xavier, Mestre em Hist6ria Social pela FFLCH-USP)


Pensando a cidade


“O olhar percorre as ruas como se fossem páginas escritas: a cidade diz tudo o que você deve pensar”…
(Calvino, ítalo-As Cidades Invisíveis, Companhia das Letras, 1990)


vista aérea do Museu Mineiro

"É certo que cidades possuíram, em épocas diferentes, diversos significados. O apelo que atraiu homens para a vida coletiva atendeu, ao longo do tempo, por nomes diversos. Mas, para além das particularidades de cada período histórico, nos interessa algo que há em comum entre eles: o imenso esforço despendido por esses homens para agrupar-se. O ‘desejo de cidade’. Um desejo absolutamente poderoso, que faz com que, através de épocas sucessivas da história humana, os homens tenham despendido enormes quantidades de energia para atender a esse canto de sereia que os conduziu rumo à materialização do organismo urbano. Conduzidos por esse desejo, o de se agrupar, é inevitável que sacrifícios tenham que ser oferecidos no altar de um deus que garantirá a possibilidade do convívio. O mais vistoso deles: o sacrifício do próprio ‘eu’. Em prol de um conjunto que se pretende coeso, os apelos que tocam apenas a um indivíduo talvez não encontrem espaço para manifestar-se. É de se pensar, portanto, na posição do desejo individual face a esse desejo coletivo tão poderoso. Em outras palavras: como fica o ‘desejo na cidade’ frente ao ‘desejo de cidade’? O que pode um frente ao outro? No espaço coletivo, qual o espaço possível a ser ocupado pelo desejo individual?"
Eliana Kuster (IPPUR/UFRJ; CEFET-ES)

Ação I

A cidade dos sonhos

Esta ação é um convite à reflexão daqueles que ajudam a materializar, no concreto, cidades antes imaginadas nos papéis.


Você que a constrói ... como seria uma cidade dos seus sonhos?


A partir de uma placa de argila de 1m² onde já se encontra esboçada uma região cortada por um grande rio e alguns acidentes geográficos, um grupo escolhido de nossos visitantes construtores ergueram sua cidade ideal.
Num segundo momento, a parte do grupo que acompanhava outra ação é chamada a se instalar também nesta cidade, sem a presença de seus antigos construtores. Concluído este segundo momento da ação, os dois grupos agora juntos, revisitaram e refletiram sobre as transformações que passou esta cidade agora redesenhada e os efeitos causados por esta interferência sobre a individualidade de cada construtor, que podem outra vez se assim desejarem, continuar a interferir agora com todo grupo.







“No início a gente projetou em grupo, mas depois veio um puxadinho daqui, outro dali... Não é assim que acontece?”.
(Fala de Júlio César Cândido durante a ação)

“Se depender deste aí, ele ocupa toda a cidade! Já fez metrô, estação de metrô, linha de ônibus, veja só, e ele num para...”.
(Fala de Frederico durante a ação).



Esta ação nos convidou a refletir sobre o impacto do aumento populacional, sobre memória e preservação, a diversidade de interesses dos vários grupos que compõe uma cidade, assim como as particularidades e individualidades dentro do grupo?

“As cidades, como nos sonhos, são construídas por desejos e medos”. (Calvino, ítalo- As Cidades Invisíveis, Companhia das Letras, 1990)

Percebemos que ela, a cidade, só toma forma a partir daquilo que lhe atribuímos:
Nossas lembranças
Nossos vínculos
Nossas identificações
Nossos encontros
Nossos desejos
Nossos medos



Finalizamos a Oficina com imagens reflexivas de uma Belo Horizonte do passado. Uma cidade que ocupa o lugar da primeira cidade brasileira moderna planejada e que projetou sua marca de 100 mil habitantes para quando completasse 100 anos, mas que já em seu centenário possuía 2 milhões de pessoas.


comissão construtora de Belo Horizonte
Ao centro Aarão Reis, engenheiro chefe da comissão contrutora, portando a planta da Cidade de Minas




Reflita:

“Para a concretização do projeto, o arraial de Curral Del Rei foi completamente destruído, com a transferência de seus habitantes para outro local. Sem condições de adquirir os terrenos valorizados da área central, os antigos moradores foram empurrados para fora da cidade”
(A B C D Prefeitura de Belo Horizonte História: O Planejamento).

“O homem cria a cidade e assim o fazendo, recria a si mesmo. Lugar da vida moderna por excelência, a cidade é o local da arte e da produção: simultânea e contrariamente, o lugar da vida é o da exclusão, dos sonhos frustrados e da marginalidade. Vida e morte se encontram na cidade da criação”.
(Hissa, 2006: 88)

“Eu semeio o vento na minha cidade, vou para a rua e bebo a tempestade”.
(Chico Buarque de Holanda)

2 - Visitando o prédio.

antiga fachada do Museu Mineiro - 1910
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Por Patrimônio Cultural entendem-se monumentos, grupos de edifícios e sítios que tenham valor histórico, estético, arqueológico, científico, etnológico ou antropológico. Um prédio antigo mostra que a cidade não nasceu naquele dia e que a cidade tem uma história. Inicialmente construído para ser a casa do Ministro da Agricultura, o prédio passou a ocupar o Senado Mineiro, a Pagadoria do Estado e atualmente o Museu Mineiro.




Sofrendo muitas modificações para readaptar-se a cada nova função que lhe era destinada, descobriu- se, em suas salas, pinturas originais decorativas por trás de diversas camadas de tinta. Submetidas a um delicado trabalho de restauro, estas salas foram observadas por nossos visitantes sobre a orientação da restauradora Cecília Drumond.




“... Osiel Marcos Alves, de 41 anos, um pedreiro de olhares e dedos curiosos. E, mesmo sendo estreante em visitas do tipo, ao admirar o teto de uma das galerias, todo emoldurado, com pinturas do século XVIII, topou o desafio de fazer uma obra como aquela: - Isso é mole para nós, ajudei a fazer um desses em fachada de prédio , revela”.
(Flávia Ayer- Estado de minas 12/03/2010).






3 - Visitando a sala da reserva técnica

foto_Estado de Minas

“Nunca tinha visto nada assim antes. Só na igreja”.
(Guilherme Dias Pinto - ajudante de limpeza)





Aqui o grupo pôde conhecer amostras ilustrativas do acervo do Museu Mineiro e ver como é feita a restauração de peças.




“Um museu é o lugar de preservação de um patrimônio que tem alguma relação com o ser humano, seus atos, vontades e como ele encara a natureza. Se precisa preservar, deve ter um espaço delimitado e próprio para isso”.
(Marco Antônio Xavier, Mestre em História Social pela FFLCH-USP)





“É importantíssimo manter o ambiente estável e propício para que as peças perdurem para sempre”.
(Cecília Drumond restauradora)



A restauradora Cecília Drumond toca aqui num interessante ponto de discussão onde podemos pesquisar vários pontos de vista, sejam eles de ordem técnica, cientifica ou simplesmente pessoal, do que é, ou deveria ser um Museu, e a preservação de patrimônios materiais ou imateriais é uma questão importante para nós. Então, partindo da questão trazida pela restauradora, podemos indagar sobre o que devemos ou deveríamos preservar "para sempre". Para tanto buscamos vários pontos não só museólogos, mas profissionais que pensam o museu e a cidade na contemporaneidade.

Mas por que devemos preservar?
Qual a razão para preservar um objeto ou monumento? Afinal, o que o homem preservará para sempre?


Questionando o nosso modo de vida



"Na cidade proliferam muros e cercas, reais e simbólicas. A importância do privado cresce tomando o tecido da cidade com seus carros transportando um só indivíduo, seus shoppings, templos de consumo, sua arte fetichizada e demarcadas como territórios de marcas famosas as quais agregam valor.
O outro, o diferente de mim, (o não civilizado, o bárbaro, o favelado, o portador de sofrimento mental) acaba por convocar ao caos, a mudança, a instabilidade. Ao subtrair o outro, elimina-se o que dele pode advir, inclusive a vida pública. O esvaziamento da rua como local privilegiado do público e do político, em que a violência, usada para justificar, a segregação ganha força. Legalizam-se então espaços para a segregação (controles sociais). Erguem-se e multiplicam-se os condomínios fechados nas cidades brasileiras; fazem-no estritamente por meio da negação da própria cidade, do convívio com a diferença e com a política. Delimitam assim a formação de modos de vida e de subjetivação, simulam-se sujeitos. Ser incluído sem fazer parte – é essa a cidade que hoje habitamos e que nos hoje habita."


fotos Tucha


É possível pensar e viver, de forma singular, a diversidade e a diferença?

Na opinião da professora Maria Nogueira, isto só ocorrerá se nos deixáramos afetar pelo outro, se topamos com o desconhecido.

O que realmente se mostra intolerável para ela é a busca pela instabilidade da homogeneização generalizada levando a nossa sociedade a uma claustrofobia interiorizada (o mundo sem fora) sem uma saída para a rua (exterioridade).

4 - Memória em construção: Os Projetos do Museu

“Acreditava-se que os problemas sociais seriam evitados com a retirada dos operários após a conclusão das obras. A cidade foi inaugurada às pressas, ainda inacabada. Os operários em meio às obras, não foram retirados e, sem lugar para ficar, formaram favelas na periferia da cidade juntamente com os antigos moradores do Curral Del Rei."
a b c d Prefeitura de Belo Horizonte. História: O Planejamento. Página visitada em 21 de julho de 2009.

“As cidades também acreditam ser obra da mente ou do acaso, mas nem um nem outro bastam para sustentar suas muralhas”.
(Calvino, ítalo-As Cidades Invisíveis, Companhia das Letras, 1990)


“A tensão não pode ser retirada da vida. É presença fundamental na política, pois a vida pública fabrica a diferença. Nosso atual modo de vida permite a “inclusão social” apenas se o diferente sofrer uma purgação de sua singularidade. Ao diferente é permitido jogar o jogo, desde que não questione as regras.
Estão dentro, mas não fazem parte simplesmente por não serem como os demais”.

(cidade e o jogo da alteridade - Maria Luíza Guimarães Nogueira/UFMG).


Os nossos projetos:
Incluindo os trabalhadores como parte atuante da cultura e sublinhando os laços de afeto que juntos podemos construir, apresentamos aos nossos visitantes os eventos e projetos desenvolvidos pelo Museu Mineiro.


Estender o Museu a todo este universo cultural diversificado e riquíssimo, que é o da cultura do Estado de Minas Gerais, seja ela a popular, adquirida a partir das vivências do quotidiano, ou a erudita, adquirida através de uma educação formal via escola, universidade, e fazendo-as mesclar-se num mesmo espaço - como geralmente objetiva-se todas as nossas ações -estabeleceremos trocas, saberes, afetos, identidades, criando assim um ambiente fértil onde podem-se desenvolver construções reflexivas da história, da memória e, principalmente, de um presente transformador. Possibilitar pluralidade de visões de mundo, que é própria da atividade museal.

“Museus devem conservar, não serem conservadores.”
Marco Antônio Xavier, (FFLCH-USP).


fotos Marconi Marques

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